FILME: O Açougueiro
O Açougueiro (Le Boucher, 1970, de Claude Chabrol) – ****
Não entendo por que Chabrol é considerado o "Hitchcock francês". Seus filmes não são thrillers. Têm temáticas similares, verdade, mas a maneira como trabalha a câmera faz a diferença. As poucas cenas de suspense não têm a decupagem elaborada do mestre inglês. Também acho equivocado enquadrar suas obras no gênero "mistério". Em seu clássico O Açougueiro é fácil adivinhar quem está retalhando as jovens numa pequena cidade francesa. Mas isto não atrapalhou meu prazer em ver o filme pois não é o ponto principal.
Ao invés disso Chabrol prefere retratar um homem e uma mulher próximos, mas não envolvidos. Durante uma festa de casamento a câmera detetive do cineasta, com um zoom, nos aproxima do casal. Ela (Stéphane Audran) é professora da escola local. Ele (Jean Yanne) é o açougueiro. A professora é otimista, acredita na raça humana – mas não no amor, pois sofreu no passado. Romântico, o açougueiro não tem fé na humanidade. Como veterano de guerra sua postura parece compreensível. A certa altura ele oferece carne embrulhada como um buquê de rosas para a professora. Mas ela ainda não está pronta para uma relação.
Chabrol revela os sentimentos dessas pessoas machucadas por dentro usando apenas o cenário e a câmera. Assim um passeio numa caverna com desenhos milenares ressalta a herança do homem primitivo e bestial. Já a polícia investigando o caso é filmada como invasores da cidade (num toque subversivo, os moradores temem os policiais mais que o assassino). Mas nada supera a luz piscando no painel de um elevador no fim do filme. Representa tanto a luta de vida e morte de um personagem quanto os sentimentos vulcânicos de outro. Sentimentos impossíveis de dizer, mas que podem ser vistos e entendidos no cinema. Como Chabrol mostra tanto com tão pouco? Nas mãos de um mestre a câmera faz a diferença. ___________________________________________________________
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