domingo, julho 13, 2008

A projeção digital em questão

A novela da projeção digital no Brasil ganhou um novo capítulo com a estréia do portal MovieMobz, criação de três empresários do setor audiovisual: Marco Aurélio Marcondes, um experiente distribuidor, Fabio Lima e José Eduardo Ferrão, fundadores da Rain Network, a primeira empresa a trazer a tecnologia de projeção digital ao país. O website começou a funcionar este mês no Brasil e há planos para disponibilizá-lo em outros países da América Latina.

O MovieMobz funciona de maneira semelhante ao orkut. Você cadastra seu perfil, cria comunidades, etc. Com um diferencial importante: você seleciona os filmes - de cinema independente, frisaram os criadores - que gostaria de assistir no cinema, estejam eles em cartaz ou ainda inéditos. Assim como a sala de cinema específica na qual você quer ver o filme. Se X pessoas quiserem ver o filme na sala Y, é lá que o filme será exibido (a matemática desse procedimento não foi esclarecida). No endereço eletrônico há uma explicação um pouco mais detalhada, é só clicar aqui.

Enquanto isso, algumas questões permanecem. Como a MovieMobz, define o que é ou não cinema independente? Será que o MovieMobz vai permitir uma variedade maior e mais surpreendente de filmes ou apenas reforçará velhos vícios de nossa programação? Além da qualidade da projeção digital, que anda bem contestada. Como contraponto, selecionei um texto da Folha escrito por Leonardo Cruz (sem autorização, mas não creio que ele se importe), que fala justamente disso. ___________________________________________________________

A projeção digital que estraga o filme

Por Leonardo Cruz

Em cartaz nos cinemas paulistanos desde a última sexta, "O Escafandro e a Borboleta" é, à primeira vista, um programa imperdível. Afinal, o filme francês de Julian Schnabel acumula boas críticas e prêmios ao redor do mundo, incluindo a palma de melhor direção em Cannes no ano passado.

Mas a forma como a obra está sendo exibida no circuito paulistano a transforma em um programa "perdível". "O Escafandro e a Borboleta" pode ser visto apenas em cópias digitais em todas as suas sete salas. Ou seja, nesses cinemas a boa e velha película analógica foi trocada por uma projeção eletrônica de qualidade inferior, que altera som e imagem originais.

O filme de Schnabel não é o único nessa situação _além dele, sete longas são exibidos em SP exclusivamente nesse sistema digital porcaria: "1958 - O Ano em que o Mundo Descobriu o Brasil", "Antes que o Diabo Saiba que Você Está Morto", "A Banda", "Dot.com", "Lady Jane", "A Última Amante" e "Personal Che". Esse número representa 19% dos filmes em cartaz, marca inédita para o circuito paulistano. Isso sem contar obras como "Do Outro Lado", que passam em película em alguns cinemas e em digital em outros.

Nada contra a migração do analógico para o digital, que fique bem claro. A questão é que o digital que se espalha por aqui é muito inferior ao que vem sendo adotado lá fora. Atualmente, apenas seis salas brasileiras seguem o padrão internacional de projeção, o DCI, de qualidade da imagem superior à da película. Em contrapartida, mais de cem salas nacionais instalaram esse digital inferior, desenvolvido e comercializado pela Rain Network.

A questão é econômica: o sistema da Rain é mais barato que o digital DCI e que a película. Resulta em menos custos para o distribuidor e para o exibidor. Só quem perde é o espectador, que continua pagando os mesmos muitos reais para ver uma projeção pouca coisa superior à de um DVD. Para essas sessões, um descontinho no valor do ingresso cairia muito bem.

Esse cenário incomoda ainda mais porque a tecnologia Rain cresce com mais força nas salas dos "filmes de arte". Nesta semana, Espaço Unibanco (Augusta e Pompéia), Cine Bombril, HSBC Belas Artes, Cine UOL Lumière, Frei Caneca Unibanco Arteplex e Reserva Cultural exibem longas no formato capenga. Mantido o ritmo atual de expansão do sistema e o baixo nível do software de exibição da Rain, o futuro não é dos melhores para os cinéfilos paulistanos: grandes filmes "off-Hollywood", como "O Escafandro e a Borboleta", ficarão cada vez mais restritos a essas projeções sofríveis.

Para quem quiser entender um pouco mais essa passagem da película para o digital, vale conferir o especial sobre o assunto escrito por Pedro Butcher para o portal Filme B. ___________________________________________________________

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