quinta-feira, março 22, 2007

Maria Antonieta

(Sofia Coppola, 2006)

Eu tinha um excelente professor de história no colégio (era a cara do Carlão), que geralmente questionava a versão oficial da História. Mas ele garantiu que Maria Antonieta realmente falou a frase "se o povo não tem pão, que coma brioche". No filme de Sofia, alega-se que ela jamais disse isso. Quem tem razão? Sei lá.

O fato é que quem quiser a Maria Antonieta dos livros escolares terá um choque. Por dois motivos. Primeiro, vai achar inadmissível um retrato positivo duma mulher que sempre foi vista como uma vadia perdulária e esnobe que enfureceu uma nação. Segundo, vai rejeitar um filme de época dinâmico e pop, cuja trilha sonora inclui Strokes, Siouxsie, The Cure, Gang of Four e tantos outros.

É nítida a intenção de Sofia de compreender sua Maria Antonieta por um olhar contemporâneo. No começo vemos ela (Kirsten Dunst, perfeita) protagonizar à força um rito de passagem de menina para mulher. Da Áustria ela é enviada ainda adolescente à França para casar-se com o príncipe Luís XVI (Jason Schwartzman). Na fronteira francesa é despida de suas posses austríacas – roupas e cachorro – para se vestir e portar como princesa francesa. Ela se casa com Luís XVI e começa a morar em Versalhes.

No palácio, enfrenta os dois principais problemas (de fácil identificação pro público jovem) de quem se torna adulto: sexo e inadequação às regras de conduta dos adultos. No primeiro caso, ela não consegue gerar um herdeiro para a família real porque o marido não consome a relação. Se ele é impotente, tímido ou não gosta de Antonieta, jamais saberemos. Já o segundo problema é mais complexo. Os protocolos de Versalhes, que regem a vida diária e os relacionamentos pessoais são rígidos demais para a garota.

Ela então cria um outro espaço na corte, onde as únicas regras são diversão e prazer. É um universo à parte, freqüentado por ela e pelos amigos que converteu. O filme se torna uma sucessão de festas, comidas e bebidas saborosamente filmados por Sofia. É um elogio à uma vida leviana. Mas também é uma transgressão de Antonieta. Talvez a única transgressão possível duma pessoa na posição dela, contra uma sociedade tão fria.

Porém, se Maria Antonieta esquece o mundo externo, o filme não. Sofia vai dando pistas dos problemas franceses da época, das decisões desastrosas de Luís XVI e da insatisfação popular. Maria Antonieta, numa série de elipses, amadurece de maneira quase imperceptível (deve ser proposital). Mas já é tarde demais – ela descobre que há rebeldias adolescentes e há revoluções. O filme termina lembrando que o mundo não existe apenas para atender nossos desejos.

Portanto, Maria Antonieta é uma obra que abraça generosamente sua protagonista e apenas pede do espectador que ele faça o mesmo. Mas não se trata dum olhar complacente. A prova? O plano inicial mostra uma criada encaixando um sapato em Antonieta. O plano final mostra Versalhes após a revolução: depois da festa a ressaca é inevitável. ___________________________________________________________

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